O plano de auxílio às distribuidoras de energia elétrica, publicado nesta semana no Diário Oficial da União, é o tema da coluna Palavra do Especialista. No papo de hoje, você vai entender no que consiste essa ajuda e como ela impacta as companhias de energia que estão na Bolsa de Valores.
Inúmeros casos de desarranjos socioeconômicos, como a crise da Califórnia nos anos 2000, acabaram por calejar governos e sociedade a respeito da necessidade de uma regulação mais dinâmica e aprofundada no setor elétrico.
A própria resposta da demanda, muito mais inelástica do que em outros setores, como o aéreo, também acende a luz dos responsáveis a respeito da necessidade de adequação das empresas do setor à condição mercadológica vigente.
Os governantes sabem que nenhum consumidor deixará de ligar a sua luz porque sua distribuidora ficou sem fundos.
Fonte: ResearchGate
As distribuidoras alegaram, dentre outros vários aspectos, a necessidade de estarem sobre-contratados para não sobrecarregar o sistema quando estiveram, a poucos meses, na mesa requerendo maior WACC. Passados alguns meses do deferimento da consulta, a sensibilidade da demanda volta novamente ao campo de debate.
Antes de nos aprofundarmos, é importante definir que classificamos como legítima a tentativa das distribuidoras de buscar um acordo para mitigar os impactos da atual crise, bem como a celeridade do governo em aprovar o pacote de ajuda ao setor.
Passada esta primeira fase, iremos para a segunda, que diz respeito ao valor que será repassado às distribuidoras. Esse dinheiro será calculado de forma mensal pela Aneel, que escutará as considerações das distribuidoras antes de definir o montante a que cada uma terá direito.
Cemig, Light, Energisa e NeoEnergia são mais alavancadas que do que IEE e Ibov.
Fonte: Bloomberg
As contrapartidas a serem executadas pelas distribuidoras incluem a não solicitação de suspensão de contratos por conta da queda de consumo e a não distribuição de dividendos acima do mínimo regulatório de 25% (caso fiquem inadimplentes), pontos que acreditamos ser congruentes dado o auxílio estatal.
Outro ponto importante é o fato de pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro de contratos serem avaliados caso a caso pela Aneel e mediante a solicitação devidamente fundamentada pelo interessado. Ou seja, o regulador definirá acerca da aplicabilidade ou não de reajustes tarifários extraordinários.
Nada mais justo para o consumidor, não? Afinal, sua conta de luz foi posta como avalista em uma negociação onde o mesmo não esteve representado, afinal, ninguém perguntou se ele aceita que sua fatura vire moeda de troca pela possível inadimplência de terceiros.
A Aneel também adiou a aplicação de reajuste nas contas para depois de junho para não onerar ainda mais o consumidor, que já reduziu sua demanda por volta de 15% desde o surgimento da atual crise.
Mas a demanda do setor não era mais inelástica ? A remuneração dos distribuidores já não levava em conta essa premissa ? Nada como uma crise para revisitarmos alguns conceitos.
A queda verificada por setor é ainda mais aterrorizante. Setores cíclicos como o de automóveis observaram fortíssima redução durante a quarentena.
Fonte: CCEE
Sendo assim, no Palavra do Especialista de hoje, destacamos dois pontos:
Nesse sentido, a Aneel ganha outra atribuição super importante pra continuar mantendo a saúde do sistema: caberá à reguladora definir os valores que serão repassados às contas dos consumidores e àqueles que serão de responsabilidade das distribuidoras, uma vez que diferentemente da crise de 5 anos atrás, os custos agora serão repartidos.
Só que desta vez os usuários deverão arcar com a queda na demanda e as distribuidoras, com as despesas relacionadas à inadimplência. Mais um motivo para você, interlocutor, acompanhar os desdobramentos dessa proposição.
Finalizamos com o impacto nas empresas que possuem ações na Bolsa. Como ainda não sabemos o quanto entrará efetivamente no caixa das companhias, seguimos com um tom defensivo quanto ao setor, priorizando empresas de transmissão com maiores margens, como a Taesa (TAEE11), e maior diversificação de portfólio, como ENGIE (EGIE3).
Em suma, mesmo não sendo o pacote dos sonhos para as distribuidoras, uma vez que haverá contrapartida financeira por parte das mesmas, esperamos impacto positivo nas ações do setor.
O pacote cobre os impactos quanto a sobrecontratação de energia, a postergação de reajustes, a antecipação de recursos para cobrir custos gerenciáveis das companhias e o mais importante: funciona como um chamariz para que a população vivencie mais o setor.
Diferentemente de 2015, a conta não recaiu apenas sobre os consumidores e, mediante aumento da popularidade do tema perante a sociedade, a tendência é que tais eventos reforcem a necessidade de haver uma gestão mais profissional por parte das empresas, o que é bom para você, leitor, tanto na figura de cliente destas empresas quanto na figura de investidor.
Um abraço!