Depois de mais de meia década de acalorada discussão, o Senado Nacional deu fim, no final da semana passada, a questão do risco hidrológico, grande impasse setorial e personagem central dos riscos de insegurança operacional e jurídica que permeavam as geradoras. A proposta de lei 3.975, agora aprovada, segue para sanção presidencial em até quinze dias.
Era até curioso que fomentássemos o destravamento de investimentos em outros setores correlatos, como saneamento e gás natural, sem resolver esta mazela que já durava anos no setor elétrico. Sem demagogia, é preciso que se dê os créditos ao atual Ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que aferiu, em entrevista no fim do mês passado em homenagem aos 60 anos do MME, que pautas estruturantes, como a questão supracitada, seriam tão logo apreciadas.
De desapercebida a extremamente verossímil e empolgante, a fala do ministro enseja ao mercado a possibilidade que mais questões, como o reequilíbrio financeiro às distribuidoras por questão da Conta Covid, sejam tão logo igualmente apreciadas.
Sobre a repactuação do risco hidrológico, as geradoras que atuam no ambiente de contratação livre e o governo mantinham diversos embates judiciais, uma vez que, mediante pluviometria deficitária, as geradoras tiveram que recorrer a operações de compra de energia no mercado à vista e insatisfeitas com a proposta do governo, conseguiam sentenças judicias que lhes permitiam não deferir pagamentos ao contingente contratado no mercado de curto prazo.
A solução acordada pelo Senado na última semana inclui a ampliação de contratos das usinas que operaram por conta do GSF abaixo de suas capacidades em troca do cancelamento dos recursos judiciais existentes em nome das geradoras e contra o governo. Uma vez sancionada, a ANEEL calcularia o prazo de extensão às geradoras em até três meses e após este período, teria até um mês para publicar seus cálculos. Passados estes quatro meses, as geradoras envolvidas teriam até dois meses para aceitar as formulações da ANEEL.
Interessante salientar também que a proposta não só caiu no agrado dos senadores, como também de todos os envolvidos no setor. A nota da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica é emblemática, ao afirmar que o evento tem a possibilidade de destravar o mercado. A partir de agora, é possível que o setor como um todo planeje temas que vão além, como seu marco regulatório e a repaginação da matriz de insumos.
Evidentemente, para calcularmos os impactos diretos nas empresas, precisamos esperar pela sanção do projeto de lei, para então saber qual vai ser a solução prevista pela ANEEL e assim, observarmos o nível de aderência das geradoras a questão.
Ademais, o nível de judicialização dos contratos das geradoras reclamantes encontra-se em diferentes estágios. Por exemplo, empresas como a Light possuem atualmente liminares que as permitem não efetuar os pagamentos outrora devidos. Para obter a concessão, estas empresas necessitariam, a priori, desembolsar o valor “atrasado”, para ter direito a extensão dos contratos. Este é o caso de Light, EDP Energias do Brasil, Chesf (Eletrobras) e AES Tietê.
No caso da Light, a companhia teria que desembolsar R$ 730 MM, o que num primeiro momento, aumentaria seu endividamento, para então, conforme decisão do regulador, ser parcial ou inteiramente compensada com a extensão do prazo de concessão de suas usinas.
Há outro grupo, composto, por exemplo, de empresas como Engie e CESP, que não possuem débitos pendentes e estão à espera apenas dos cálculos e por conseguinte, dos prazos de extensão de suas usinas.
Independentemente do grupo em que estejam, a notícia é inteiramente positiva para todas as companhias envolvidas e tira destas, além de todo o setor, o peso de meia década de ineficiência.
Lembramos que temos recomendação de compra para AES Tiete, Eletrobras, Copel, Cesp, Cemig.
Quanto à Cemig, é válido ressaltarmos que nossa recomendação já contempla a expectativa de vermos vetado pela presidente o trecho onde está em jogo uma disputa de R$ 5 bilhões da empresa com a tesouro. Além desta questão, esperamos que o presidente vete também a criação do Brasduto.
Esperamos que o bom senso que prevaleceu nesta decisão se verifique também em mais matérias e que, com a sanção parcial por parte do presidente e os cálculos aferidos pela ANEEL, possamos ver tal questão finalmente resolvida. É de soluções como estas que o país precisa para voltar a crescer de forma forte. Até a próxima!