Dólar é mais caro no Brasil do que em outros países emergentes
No Palavra do Especialista de hoje, vamos falar sobre um assunto que desperta a atenção de muita gente: o câmbio. Independentemente da época, esse tema sempre está sob os holofotes dos economistas, imprensa e mercado, seja no regime cambial flutuante ou fixo e até mesmo na economia aberta ou fechada.
Durante uma pandemia, a importância desse ativo se multiplica, uma vez que os impactos são diferentes entre os países, bem como os respectivos instrumentos de combate aos danos.
Com esse conjunto de alterações, torna-se mais difícil avaliar as posições relativas de cada uma das economias e tal volatilidade se reflete nos mercados, em especial, no câmbio, nublando também a capacidade preditiva dos analistas.
Dadas as devidas limitações e entre os diversos modelos nos quais lançamos mão para projetar a cotação do dólar no Brasil, o que nos tem chamado a atenção é o descasamento entre o preço da moeda americana em reais frente aos países pares do Brasil.
Metodologicamente, chegamos a esse descasamento ao compararmos o BRL com o produto de um modelo no qual estimamos a moeda brasileira com base no movimento conjunto (PCA) da cotação do dólar na África do Sul, Chile, Indonésia, Rússia, Colômbia e México, agregados a uma constante.
É evidente que o BRL, em função das idiossincrasias brasileiras, tem relativa autonomia perante seus pares. Não obstante, como podemos observar no gráfico abaixo, pequenas oscilações marginais e, principalmente, o movimento tendencial colocam uma âncora em uma alta exponencial da moeda.
Avaliamos que apenas uma percepção de piora relativa do Brasil justificaria esse diferencial. Contudo, essa percepção não mensurável por outras variáveis objeto dificulta a modelagem do supracitado descasamento. Testamos outras séries relativas a fim de buscar o melhor poder de explicação do modelo, mas nenhuma se fez relevante o suficiente para justificar a adoção junto às premissas.
Seja a própria deterioração das contas domésticas, relativas aos pares supracitados, ou até mesmo o diferencial de juros, principalmente de taxas longas, não justificaram tal avanço sobremaneira do dólar em reias.
Assim, reafirmamos nossa projeção para o câmbio ao final de 2020 em R$4,70/US$.
Dois vetores justificarão tal apreciação. O primeiro, como se deve imaginar, está associado à redução desse diferencial entre o dólar em reais e seus pares. Até o momento não tivemos uma piora fiscal maior do que os pares nem mesmo grandes mudanças na dinâmica da trajetória da dívida justificada por elevações permanentes nos gastos, e para que o estreitamento das variáveis ocorra é fundamental que isso continue dessa maneira.
Não estamos afirmando que todo esse hiato deverá ser consumido de uma hora para outra, apenas que ao longo do ano deveremos assistir uma redução gradual na percepção de piora relativa supracitada, tendo em vista que esperamos que haja a consolidação do cenário atual prospectivamente.
Vale relembrar que esperamos um recuo de 5% no PIB de 2020, com breve avanço em 2021 de 3,0% e consolidação da dívida bruta ao redor de 91% do PIB ao longo dos próximos anos.
O segundo vetor de apreciação está associado a uma redução do risk aversion global, uma vez que trabalhamos com a hipótese de que a pandemia do covid-19 será atenuada, invertendo o fluxo de capitais para o sentido de emergentes. Como já se deve ter observado, tal premissa fará com que todos os pares emergentes, inclusive o Brasil, mostrem uma apreciação.
Em finalização, não custa destacar que as oscilações cambiais de curto prazo não inviabilizam os fundamentos aqui expostos, uma vez que estamos apontando uma projeção apenas para o final do ano.
Por Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, e Guilherme Sousa, economista da Ativa Investimentos.
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Étore Sanchez